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segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Na dança dos relógios


     Não, este não é mais um texto pra avaliar perdas e ganhos nem pra reclamar do horário de verão. O que eu quero é aproveitar a mudança para acertar os ponteiros com o meu tempo. Em anos anteriores, na véspera da troca, eu saía feito um fantasma da meia-noite, mexendo em todos os relógios – os de casa e os pessoais – como se o esquecimento de um fosse atrapalhar toda a minha rotina.
    
     Desta vez, foi diferente. Meu celular se alterou automaticamente. Só no dia seguinte, acertei aquele único relógio que iria usar. E pronto. Todos os outros continuam com uma hora de atraso, fora das convenções. E olha que são, pelo menos, 4 ou 5. Não fiz isso intencionalmente, mas acabei concluindo: pode ser um bom treino pra não ser tão ansiosa e querer mudar tudo de uma vez. Tenho essa mania de me antecipar demais, de achar que não há mudanças sem choques. É bom aprender a fazer por etapas, gra-da-ti-va-men-te! Reagir à medida que a situação se apresentar.

     Claro que os compromissos vão ser mantidos porque a agenda não depende só de mim. Mas olhar, de vez em quando, para o relógio inalterado faz lembrar que existe outro tempo e que, em breve, eu volto pra lá. Nada de radicalismos.
    
     Também pretendo aproveitar esses dias mais longos para outra prática – treinar a adaptação. Sou daquelas que levam duas semanas para entrar no novo horário. Durmo bem mais tarde e acordo muito sonolenta. Coisas de touro empacado mesmo. OK. Esta será uma ótima oportunidade para ser mais flexível.

     E deixo as sugestões pra você que também custa a dormir nestes dias. Que tal ocupar as horas da falta de sono no namoro ou num encontro prolongado com os amigos? Sair pra correr à noite ou escrever crônicas, como estou fazendo agora... Se der, a gente empurra um pouquinho o momento de acordar.

     Meu primeiro fim de tarde desse horário de primavera com cara de verão foi bem bonito. Foi só por causa da dança dos relógios que vim pra casa com as cores do pôr-do-sol. Cores inacreditáveis na mistura de flores roxas, céu rosado, o fim da luz natural e o começo da artificial. Então que seja assim: que a gente tenha muitos dias iluminados pela frente, com ou sem sono...
     

sexta-feira, 27 de julho de 2012

Pra você, JF!


O relógio da Praça da Estação marca oito horas e alguns minutos, mas poderia ser qualquer outro horário porque o tempo aqui é o da lembrança. E o som é do trem que ainda corta a cidade. Há quinze anos, eu deixei o meu lugar. Voltei muitas vezes porque meu afeto continua lá, mas me faltava aquele olhar de turista, que descobre novidade onde outros enxergam rotina.

O nosso humilde Big Ben resiste solenemente, compondo a paisagem do Rio Paraibuna, rio desprezado, acusado de ser feio e poluído. Rio de “águas pardas” na descrição do poeta Murilo Mendes. Turvo, sim, mas também generoso na sua largura. E democrático. Mães com carrinhos de bebê, passeios com cachorros, caminhada, moradores de rua que dormem à beira do rio. Só agora eu descobri, numa passarela para pedestres, dois banquinhos pra quem quiser dar uma olhada menos preconceituosa para o nosso Paraibuna.

Cariocas do brejo? Isso é maldade com a gente... Torcemos, sim, para times do Rio de Janeiro, mas não trocamos o s pelo x, como dizem por aí. No máximo, costumamos acrescentar um i antes do s ou z em palavras como três e arroz, mas é só. A partir daí, já é implicância gratuita com nosso sotaque.

Ah, não temos mar, mas temos um Calçadão, onde tudo acontece e todos se encontram. Manifestações, políticos pedindo votos, gente vivendo o dia-a-dia. O Cine Palace e o Teatro Central. Quem é de fora sempre põe um som inglês para o nosso H da Rua Halfeld. Aprenda: na pronúncia de quem é da cidade, o H é ignorado e, cá entre nós, soa bem menos pedante.

O nosso Calçadão tem os melhores pipoqueiros que já conheci. O segredo da pipoca que dá fila são os queijinhos em cubos, quentinhos. Infância na ponta da língua. A coxinha de frango e Catupiry de uma lanchonete pequena e da época da minha adolescência... O bolo da Casa de Doces Brasil, cheio de glacê e com recheio inconfundível. Não importa se depois provei sobremesas mais saborosas e sofisticadas. Esse gosto nunca se perdeu.

Adoro andar sem rumo pelas galerias estreitas e pelas ruas do centro. Nenhum shopping, por mais requintado que seja, substitui esse prazer de ter várias lojinhas aconchegantes ou de fazer compras ao ar livre. E você sempre tromba com algum conhecido, mesmo quem vive longe há muito tempo, como eu.

Vista do Mirante do Cristo, Juiz de Fora parece cada vez maior e mais alta, com muitos prédios espremendo as casas. Mas a imagem que me marcou no mês de julho foi a do céu. Na cidade, nublada por natureza, o inverno costuma tingir a paisagem de azul. Foi assim nos cinco dias em que estive por lá.

Na hora de ir embora, pouco antes das 8 da manhã, uma surpresa. Passo pelo mesmo Paraibuna, agora encoberto pelas brumas. Juiz de Fora embaçada como num sonho. Os carroceiros, às margens do rio, dão um ar de passado à cena. Só depois que saí de lá é que percebi: JF deixa meu cabelo rebelde, meio anelado, meio indomável. Mas essa cidade fria e úmida está dentro de mim. E me deu a maior saudade das manhãs geladas a caminho da escola.