Tinha tudo pra
ser um dia comum. Uma segunda-feira de sol. Eu, a caminho da academia. Ia a pé.
Gosto de andar pelo bairro e, como fiz tantas outras vezes, aproveitava pra
falar com minha mãe. Quando a moto parou ao meu lado, pelo olhar dele, eu já
sabia que seria assaltada. Ele ainda tentou fingir que queria apenas uma
informação, mas, tão logo conseguiu chegar mais perto, anunciou: “me dá seu
celular”. Não tive tempo de explicar a minha mãe o que acontecia, mas
ela ouviu uma boa parte do momento de tensão. Assim que ele fugiu, eu só
pensava em avisá-la que estava tudo bem comigo. Nada mais me importava naquele
momento.
A sensação é horrível.
Medo, raiva, vulnerabilidade. Foi como se tivessem levado meus sapatos e me
mandado seguir descalça num asfalto quente. Sem rumo. Ao seguir, sem olhar pra
trás, ele ainda me ameaçou que voltaria, caso eu registrasse ocorrência. Mas
logo encontrei pessoas solidárias. Na academia, na rua, no posto de gasolina
que ficava perto do local do assalto. Depois, a atenção da Joana, que
estava na minha casa e com quem pude dividir o drama. De longe, meus pais, meu
namorado, minha prima-irmã me apoiando pelo meu
telefone fixo ou pelo computador, já que o celular estava em outras mãos. Fiz
todos os bloqueios possíveis, registrei a ocorrência e fui trabalhar.
O primeiro dia
foi horrível! Na manhã seguinte, acordei um pouco mais calma e fiz questão de
ir à academia, apesar do medo. Eu precisava vencer isso ou acabaria limitando
minha rotina. Foi aí que comecei a observar a vida fora do mundo virtual. Não sem
antes pensar se deveria avisar, nas redes sociais, que estaria desconectada por
alguns dias, sem WhatsApp, sem celular. Decidi que o silêncio, naquele momento,
seria melhor. E cheguei a uma conclusão libertadora: quem quisesse me achar
daria seu jeito. Eu não precisava estar acessível o tempo todo.
Só agora,
duas semanas depois, resolvi contar essa história. Conversei com muitas
pessoas, ouvi vários casos parecidos, mas comigo nunca tinha ocorrido. Estar
desconectada foi como estar de férias. Percebi o quanto a gente se
torna dependente do celular. Aquelas olhadas, o tempo todo, pra conferir e-mail,
mensagem, a pressa de responder, a prontidão. Como foi bom ficar livre de tudo
isso por um tempo...
Comprei um aparelho
pequeno, de 100 reais, e só uso pra falar mesmo. Nem pra torpedo ele serve muito.
Mas era a pequena segurança num caso de emergência. Sei que vou precisar
retomar o uso do celular inteligente e “exigente”. Nesta semana mesmo, vou reativar
meu chip em outro aparelho. Não tive pressa pra voltar. E, amigos queridos,
acho que vou ser um pouquinho mais lenta pra responder...
Minha agenda
de papel, que estava praticamente limpa, agora tem páginas e mais páginas de
anotações. Comecei a olhar menos pra baixo e mais para as pessoas que circulam
pelas ruas. No sinal, em vez da ansiedade de checar informações, observo as
árvores coloridas da Avenida Pedro II. O ritmo do pensamento diminuiu.
Sei que perdi fotos, notas, contatos. Já havia
algum tempo que não fazia backup porque sou preguiçosa com isso e porque não
achava que seria assaltada. Muito do que sumiu só vou perceber na instante da
necessidade. Nada tão importante ou irrecuperável assim. O celular, perdido pra
sempre, deixou a lição do desprendimento.
Não minto.
Ainda estou assustada. Meu coração ainda dispara se uma moto chega muito perto.
Ando pelas ruas atenta. Mas prefiro acreditar que fui muito protegida. Num dos
primeiros dias, em que eu ainda estava triste e insegura, quando voltava pra
casa à noite, um Louva-a-Deus, de um verde muito vivo, pousou no vidro do meu
carro e, juro, veio comigo até a garagem da minha casa. Uma viagem que durou
uns 20 minutos. Uma surpresa poética que, pra mim, foi um sinal e a confirmação
da proteção divina!