Depois
de uma noite curta e de um café corrido no hotel, entrei no barco.
Ainda era muito cedo, mas já fazia calor. Desanimada e sonolenta,
imaginei que aquela viagem de Dubrovnik para Hvar, na Croácia,
poderia não ser das mais agradáveis. Ligeiramente mal-humorada,
resolvi sair pra respirar um pouco na área descoberta. Cheguei a
tempo de ver a âncora se soltando... Naquele instante, começou a
magia. A imagem da cidade que ficava pra trás se misturou à espuma
branquinha do mar azul-turquesa, colorido pela luz dourada do sol da
manhã. Suspirei com aquela cena e descobri que eu não era a única
encantada.
É
por momentos como esse que não consigo parar de procurar destinos
diferentes. Dizem que é um luxo. Pra mim, é quase uma necessidade.
Nunca fiz as contas, mas acho que poderia ter comprado mais um carro
ou mais um apartamento com o dinheiro que já gastei por aí. Não me
arrependo. Viajar é escolha e talvez seja esse o meu maior
“investimento”.
Já
passei por lugares lindos e exóticos. Lugares que sempre me dizem
algo. Atravessando uma avenida de Istambul, na Turquia, ao lado de
uma multidão, pensei que o mundo é cheio de cabeças e de
personagens e vi o quanto sou insignificante. Numa rua de Nova York,
atores da Broadway, vestidos de bichos, levaram-me de volta à
infância. Num dia de chuva, em San Juan, capital de Porto Rico,
enquanto passeava num ônibus antigo, percebi que existem muitos
meios de se ganhar a vida e que não existe fórmula pra nada.
Conheci um animador de navio, que trabalha, pulando de um cruzeiro ao
outro. Quase sempre longe de casa e da terra. Na praça, outro homem
se sustenta, alimentando pombos para que os turistas tirem fotos com
as aves. Um serviço estranho, sim, mas que tem procura.
E
ainda vi o céu estrelado do Deserto de Atacama, dancei com nativos
numa ilha do Pacífico. Num catamarã em Curaçao, depois de um
banho-surpresa das ondas em alto-mar, entendi o quanto é perigoso
remar contra os ventos e contra a maré. Um treino para a vida? Acho
que sim... Foi lá também que me deslumbrei com a cor das praias e
com a sonoridade do papiamento, a língua já falada pelos escravos
com influências de idiomas europeus, inclusive, do Português. Um
som primitivo, forte, como as gargalhadas, o riso fácil dos
moradores da ilha. Gosto muito desses locais que não são óbvios.
Viagens
também me provocam mudanças de rumo, correção de rota. Voltei do
Chile e pedi demissão de um bom emprego. Lá longe, na Ilha de
Páscoa, conhecida como “umbigo do mundo”, concluí que precisava
cortar o “cordão” com a empresa simplesmente porque não estava
feliz. Foi também no retorno de outros lugares que decidi romper
relações que não me faziam crescer.
Nem
sempre é bonito. Nem sempre é fácil. No meio das belezas, há
sustos e obstáculos. Já fiquei doente e não sabia explicar ao
médico da Romênia o que exatamente eu sentia. Já perdi rodinhas de
mala, perdi voos, passei noites em aeroportos ou em destinos
imprevistos. Passei horas numa praça de Amsterdã, vigiando a
bagagem, enquanto amigos procuravam hotel na cidade lotada em pleno
feriado nacional. Torço o nariz pra algumas comidas... Você pede e
nunca sabe o que vem na tradução dos ingredientes. Nada disso me
desanima ou me tira o prazer de explorar o mundo.
Uma
frase que se ouve, um sorriso franco que se recebe, a gentileza de
quem quer fazer você se sentir em casa, paisagens inesquecíveis
compensam qualquer situação inusitada. Países como Bulgária,
Canadá, Alemanha; cidades como Londres, Paris, Madri, a energia
inexplicável de Machu Picchu ou um lugarejo do interior de Minas.
Tanto faz... Tenho sempre a mesma curiosidade e uma lista enorme de
roteiros para as férias de cada ano. Lugares pra conhecer, pra
revisitar, pra experimentar outra vida por uns dias e voltar, sempre
diferente, mais flexível, mais tolerante, mais observadora. Viajar é
sempre pra fora e por dentro.
(Crônica publicada na Revista Encontro Luxo em dezembro de 2013)